Como poderosos interesses tomam as terras de camponeses, pastoralistas e outros por todo o mundo
Por Joseph R. Stromberg
Resenha do livro The Land Grabbers: The New Fight over Who Owns the Earth, de Fred Pearce, Beacon Press.
The Land Grabbers é uma ótima introdução às mais novas manifestações de uma antiga forma de pilhagem: a tomada dos recursos de outras pessoas e a destruição de seus sustentos. O autor, Fred Pearce, é um conhecido jornalista ambiental britânico. Aqui ele examina a alienação em andamento de terras "ociosas" ou "sub-utilizadas" na África, na América Latina, no leste asiático, na Rússia, na Ucrânia, na Geórgia, na Austrália e em vários outros lugares para as mãos de corporações internacionais, tanto privadas quanto estatais. Os políticos nos países afetados são parceiros-chave nas operações, que lembram a corrida pelo controle da África no final do século 19. As tomadas de terras têm como meta enriquecer empresas privilegiadas e seus aliados políticos, normalmente em detrimento daqueles que já ocupam a terra. Os estados, as empresas e seu aliado usual, o Banco Mundial, não veem motivos para respeitar os ocupantes donos e usuários dos recursos, quaisquer que sejam seus direitos estatutários pós-coloniais ou de jurisprudência. Nômades pastorais são ainda menos respeitados. Na Tanzânia, por exemplo, os governos e capitalistas de safáris reduziram as terras tradicionais reservadas ao pastoreio dos Maasai para uma fração do que eram. E na Etiópia a política governamental de "vilagização", afirma Pearce, realoca os camponeses "da mesma maneira que Stálin, Mao e Pol Pot", abrindo caminho para acordos com capitalistas estrangeiros.
No caso da agricultura, as ações são realizadas sob a justificativa ideológica de que somente fazendas de escala industrial, estruturadas como o subsidiado agronegócio americano, podem alimentar o mundo. Os ideólogos em questão incluem John Beddington, cientista chefe do governo britânico; Paul Collier, ex-diretor de pesquisas do Banco Mundial; e Richard Ferguson, da companhia de investimentos Renaissance Capital, que sonha em ver "fazendas industriais de um milhão de hectares". Para realizar essa visão, pequenos proprietários, caçadores, coletores e pastores devem sair da frente e submeter ao trabalho assalariado, onde quer que o encontrem. Essa ideologia anda de mãos dadas com o tipo de globalização que depende do poder dos Estados Unidos e de alguns países associados para ditar os contornos do comércio mundial. Embora os Estados Unidos tenham derrubado estados vistos como hostis aos interesses comerciais americanos (como na Guatemala em 1954), os métodos atuais são normalmente mais sutis. Incluem programas da USAID, a dominação americana das políticas do Banco Mundial e uma teia de tratados que criam obrigações, especialmente em acordos de investimento internacional.
Pearce é um ambientalista, mas seu livro não é especialmente ideológico. Ele tem mais interesse na apresentação de dados. Quando possível, ele apresenta dados sobre o tamanho de áreas em acres (ou hectares) e afirma quem fez o quê e em que lugar. Ele também culpa os ricos ambientalistas utópicos e suas ongs, afirmando que seus parques e reservas podem deslocar as populações locais e suas propriedades, da mesma forma que reservas de caça comercial, plantações de açúcar e áreas para exploração de madeira também podem.
Pearce dá os nomes dos empresários, empresas e políticos envolvidos, esboça seus motivos, alianças e conflitos mútuos. Ele considera seus motivos também, que vão além de dinheiro e poder. A Arábia Saudita, os Emirados Árabes Unidos e a China, por exemplo, carecem de terras aráveis. Para assegurar o acesso a commodities necessárias (ou de maneira lucrativa), corporações estatais chinesas e árabes arrendam áreas onde podem, e esses arrendamentos podem durar décadas. A moda dos biocombustíveis como o pinhão manso tem levado várias companhias a arrendar grandes áreas de terra, mas esses projetos não têm se materializado. Altos especuladores financeiros, na rápida fuga do colapso dos derivativos, têm buscado fugir para commodities como o milho e a soja, mesmo se isso significar o desalojamento de camponeses e outros usuários de recursos que estavam primeiro nos locais, em países como Etiópia e Brasil.
Muito tempo atrás, o jornalista econômico Terence McCarthy descreveu o resultado final das indústrias de extração que trabalhavam com recursos não-renováveis em solo estrangeiro: "nada é deixado além dos buracos no hão, alguns estreitos e profundos, outros largos e rasos – até que todo o terceiro mundo se torne a Virgínia Ocidental". Pelo menos hoje em dia os beneficiários das terras plantam alguma coisa. Os camponeses deslocados não parecem achar tal fato muito reconfortante. Arrendatários estrangeiros constantemente avançam sobre pequenos proprietários e, quando necessário, tratam os donos e usuários anteriores das terras como invasores e criminosos. Suas represas inundam as plantações dos outros – o tipo de conflito que as cortes americanas tiveram que resolver no começo do século 19, muitas vezes em favor dos latifundiários de então. As companhias de extração de madeira da Indonésia estabeleceram o parâmetro para agressão violenta contra seus vizinhos, como lembrou um local da província de Riau: "Um dia, simplesmente fomos roubados de nossa terra comunal." Adicionalmente, as atividades dos madeireiros poluíram córregos, reduzindo a disponibilidade de peixes. O general Suharto, ditador virtual da Indonésia de 1967 a 1998, entregou enormes regiões florestais para seus aliados e arrancou os habitantes das localidades das terras.
Pearce menciona um camponês que foi expropriado na Sumatra que disse: "Não temos mais como viver aqui agora." A palavrinha "agora" tem que estar no começo de qualquer discussão que envolva ex-camponeses que vão para as cidades para trabalhar em péssimas condições em empregos a baixos salários. Sim, sob essas condições, as pessoas podem até querer assumir esses empregos. A questão relevante é a de por que elas deveriam. Eles preferem as oportunidades urbanas à vida no campo? Ou a tomada das terras tirou pessoas anteriormente independentes de suas casas?
Pearce habilmente defende os pastoralistas contra a fábula criada por Garret Hardin sobre a "tragédia dos comuns", segundo a qual os usuários de recursos comuns vão super-explorá-los, levando à degradação no longo prazo. A resposta de Pearce é que os usuários dos comuns criaram instituições que permitem que eles gerenciem os recursos e evitem esse resultado. (O trabalho de Elinor Ostrom, E. P. Thompson e J. M. Neeson dá suporte a essa posição.) Ele argumenta em prol da capacidade dos pequenos proprietários de inovar localmente, adicionando que as modernas comunicações pode rapidamente dispersar essas descobertas. Uma vez que essas formas de produção não têm problemas, não há necessidade de "consertá-las".
A recente onda de tomadas de terras é um processo em curso. Pearce não alega que todas elas vão terminar em desastre, mas muitas vão. Por um breve momento nos anos 1970, libertários como Roy Childs e Murray Rothbard levantaram a questão dessas expropriações de terras. Mais tarde o interesse diminuiu, e a teoria monetária, estruturas de capital e outros temas se tornaram centrais. Agora, porém, as tomadas de terras estão de volta e os libertários devem dar a ela a atenção que merece.
Traduzido por Erick Vasconcelos
Joseph R. Stromberg é um historiador independente e escreve regularmente artigos para diversos veículos políticos.
Veja também:
- O subsídio da história
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