terça-feira, 6 de agosto de 2013

Quais São As Especificidades?


Por Karl Hess

O Libertarianismo é claramente o mais, talvez o único, movimento verdadeiramente radical na América. Ele entende os problemas da sociedade em sua raiz. Não é reformista em sentido algum. É revolucionário em todo sentido.

Porque a maioria de seus adeptos, entretanto, veio da direita, ainda paira sobre ele uma aura, ou, talvez, um miasma de defensividade, como se seus interesses realmente se centrassem em, por exemplo, defender propriedade privada. A verdade, é claro, é que o libertarianismo deseja avançar os princípios da propriedade mas de forma alguma pretende defender, sem mais nem menos, toda propriedade que atualmente é chamada de privada.

Muita dessa propriedade é roubada. Muita é de título duvidoso. Está profundamente interligada com um sistema estatal coercitivo, imoral, que sancionou, constituiu e lucrou com a escravidão; se expandiu e explorou através de uma política externa imperial e colonial brutal e agressiva, e continua a manter as pessoas numa relação a grosso modo de servo-mestre com concentrações de poder político-econômico.

Os Libertários estão preocupados, primeiro e acima de tudo, com a mais valiosa das propriedades, a vida de cada indivíduo. Esta é a propriedade mais brutal e constantemente abusada pelos sistemas estatais, sejam eles de direita ou de esquerda. Direitos de propriedade relacionados a objetos materiais são vistos por libertários como emanando, e como um importante secundário do direito de possuir, direcionar, e desfrutar de sua própria vida e daqueles acessórios adicionais que podem ser adquiridos sem coerção.

Os Libertários, em resumo, simplesmente não acreditam que o roubo é apropriado se é cometido em nome de um Estado, classe, crise, credo ou clichê.

Isso está muito longe de compartilhar opiniões com aqueles que desejam criar uma sociedade na qual super-capitalistas estão livres para juntar grandes posses e com aqueles que dizem que isso é o propósito mais importante da liberdade. Isso é nonsense proto-heróico.

O Libertarianismo é um movimento popular e um movimento de libertação. Ele procura um tipo de sociedade livre, não coercitiva, na qual as pessoas, vivas, livres e distintas, possam se associar livremente, desassociar, e, como bem julgarem, participar nas decisões que afetam suas vidas. Isso significa um verdadeiro livre mercado em tudo desde idéias até idiossincrasias. Significa pessoas livres coletivamente para organizar os recursos de sua comunidade mais próxima ou organiza-los individualmente; significa a liberdade de ter um judiciário baseado e apoiado na comunidade aonde desejado, nenhum onde se preferir, ou serviços de arbitração privada aonde isto é visto como mais desejável. O mesmo com a polícia. O mesmo com escolas, hospitais, fábricas, fazendas, laboratórios, parques e pensões. A liberdade significa o direito de moldar suas próprias instituições. Ela se opõe ao direito dessas instituições te moldarem simplesmente graças a um poder acumulado ou status gerontológico.

Para muitos, entretanto, esses princípios fundamentais do libertarianismo radical continuarão meras abstrações, e até mesmo suspeitos, até que se desenvolvam e propostas específicas, agressivas.

Não há praticamente nada radical, por exemplo, naqueles que dizem que os pobres deveriam ter uma cota maior da receita Federal. Isso é reacionário, pedir que a instituição do roubo estatal seja feita mais palatável ao distribuir sua pilhagem para pessoas mais simpáticas. Talvez ninguém lúcido pudesse se opor mais a dar fundos Federais para pessoas pobres do que gastar o dinheiro no assassinato de combatentes camponeses Vietnamitas. Mas argumentar tais méritos relativos deverá acabar sendo simplesmente reformistas e não revolucionário.

Libertários poderiam e deveriam propor táticas revolucionárias específicas e metas as quais tenham significado para pessoas pobres e para todas as pessoas; analisá-las profundamente e demonstrar-lhes com exemplos o significado da liberdade, liberdade revolucionária.
Eu, por exemplo, rogo ardentemente tal pensamento de meus camaradas.
As propostas deveriam levar em conta o tratamento revolucionário da propriedade roubada “privada” e “pública” em termos libertários, radicais e revolucionários; os fatores que têm oprimido as pessoas até então, e tudo o mais. Murray Rothbard e outros teorizaram muito nessa direção, mas não é justo o bastante que apenas tão poucos carreguem o fardo.
Deixem me propor apenas alguns poucos exemplos de questões específicas, radicais e revolucionárias as quais os membros de nosso Movimento poderiam muito bem se perguntar.

  • Posse da terra e/ou uso da mesma numa situação de poder estatal declinante. A situação de Tijerina [1] sugere uma abordagem. Podem haver muitas outras. E quanto (realisticamente, não romanticamente) a responsabilidade e prevenção da poluição do ar e da água?
  • Direitos ou deveres de trabalhadores, acionistas e comunidade em estabelecimentos produtivos em termos de análise libertária e propostas específicas num contexto radical e revolucionário. O que, por exemplo, poderia ou deveria acontecer com a General Motors numa sociedade livre?
De particular interesse para mim de qualquer maneira, é focar análise libertária e ingenuidade em acabar a grande tarefa inacabada da abolição da escravatura. Simplesmente deixar os escravos livres, num mundo ainda dominado por seus mestres, foi obviamente uma injustiça histórica. (Os Libertários sustentam que o Sul deveria ter sido permitido se separar para que os próprios escravos, juntamente com seus amigos Nortistas, pudessem ter construído um movimento de libertação revolucionário, subjugado seus antigos mestres, e assim delineado as reparações de revolução.) Pensamentos em reparações hoje em dia estão perturbados por preocupações de que estas seriam praticadas contra pessoas inocentes que de maneira alguma estavam ligadas à opressão antiga. Há uma área na qual isso pode ser evitado: o uso de terras e estabelecimentos “possuídos” pelo governo como itens de troca para compensar os descendentes de escravos e tornar possível a eles participar nas comunidades da terra, finalmente, como iguais e não como dependentes.

Em algum lugar, devo supor, existe um libertário que, compartilhando a idéia, possa elaborar uma proposta boa e consistente para a justiça nesta área.

Obviamente a lista é interminável. Mas o ponto é finito e precisamente focalizado.

Com o libertarianismo se desenvolvendo agora como Movimento, ele requer seria e urgentemente propostas inovadoras, metas específicas e radicais, e uma agenda revolucionária que possa traduzir seus grandes e perenes princípios em cursos oportunos e poderosos de ação possível ou até mesmo prática.
Que país pode preservar suas liberdades se seus comandantes não são avisados de tempos em tempos que seu povo preserva o espírito de resistência? Eles que se armem.”
Thomas Jefferson, 1787

The Libertarian Fórum, 15 de Junho de 1969


Nota do Tradutor
[1] Sobre Reies Tijerina.

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Karl Hess foi um escritor e ativista político americano. Sua carreira inclui desde passagens no Partido Republicano à integrante do movimento Nova Esquerda, onde defendeu até o fim de sua vida o anarquismo de mercado.

Traduzido por Rafael Hotz.

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