segunda-feira, 13 de maio de 2013

Uma Nova Declaração de Independência


Por Emma Goldman

Publicado originalmente em Mother Earth, Vol. IV, No. 5, Julho de 1909.

Quando, no curso do desenvolvimento humano, as instituições existentes provam-se inadequadas às necessidades do homem. Quando elas servem meramente para escravizar, roubar, e oprimir a humanidade, o povo possui o direto eterno de se rebelar, e derrubar, estas instituições.

O mero fato destas forças – antagônicas a vida, a liberdade, e a busca de felicidade – estarem legalizadas pela constituição, santificadas por direitos divinos, e reforçadas pelo poder político, de nenhum modo justificam o prolongamento de sua existência.

Sustentamos que estas verdades sejam auto-evidentes: que todos os seres humanos, independentemente de raça, cor, ou sexo, nascem com o direito igual de compartilhar à mesa da vida; e que para que este direito seja assegurado, deve se estabelecer entre os homens a liberdade econômica, social e política; sustentamos além, que o governo existe apenas para manter privilégios especiais e o direito a propriedade; que coage o homem à submissão e, portanto, rouba sua dignidade, seu auto-respeito, e sua vida.

A história dos reis americanos do capital e da autoridade é a história de repetidos crimes, injustiças, opressões, ultrajes, e abusos, todos almejando a supressão das liberdades individuais e a exploração do povo. Um país vasto, rico o bastante para suprir todos seus filhos com todos os confortos possíveis, e assegurar o bem-estar a todos, está nas mãos de uma minoria, enquanto que os milhões de anônimos ficam à mercê de implacáveis caçadores de fortunas, legisladores inescrupulosos e políticos corruptos. Robustos filhos da América estão sendo forçados a mendigar pelo país numa busca infrutífera por pão, e muitas de suas filhas estão sendo despejadas nas ruas, enquanto centenas de crianças em tenra idade são sacrificadas diariamente ao altar de Mamon[1]. O reinado destes reis está mantendo a humanidade em escravidão, perpetuando a pobreza e a doença, sustentando o crime e a corrupção; está pondo a ferros o espírito da liberdade, estrangulando a voz da justiça, e degradando e oprimindo a humanidade. Está engajado numa contínua guerra e matança, devastando o país e destruindo as melhores e mais nobres qualidades do homem; nutrindo superstições e ignorância, semeando o preconceito e a discórdia e convertendo a família humana em um campo de Ismaelitas[2].

"Todos os seres humanos, independentemente de raça, cor, ou sexo, nascem com o direito igual de compartilhar à mesa da vida; e que para que este direito seja assegurado, deve se estabelecer entre os homens a liberdade econômica, social e política."

Nós, portanto, os homens e mulheres amantes da liberdade, compreendendo a grande injustiça e brutalidade deste estado de coisas, com ousadia e seriedade declaramos por meio desta que cada individuo é e deve ser livre para possuir a si próprio e para gozar plenamente dos frutos de seu trabalho; que o homem está absolvido de quaisquer obrigações para com os reis da autoridade e do capital; que ele possui, pelo próprio fato de existir, livre acesso a terra e a todos os meios de produção, e a completa liberdade de dispor dos frutos de seus esforços; que cada individuo tem o inquestionável e inalienável direito de associação livre e voluntária com outros indivíduos igualmente soberanos para propósitos econômicos, políticos, sociais e quaisquer outros, e que para alcançar este fim o homem deve emancipar a si próprio da sacralidade da propriedade, do respeito às leis dos homens, do temor à Igreja, da covardia da opinião pública, da estúpida arrogância de superioridade nacional, racial, religiosa e sexual, e da estreita concepção puritana de vida humana. E em prol desta Declaração, e com uma reta confiança na harmoniosa combinação de tendências sociais e individuais do homem, os amantes da liberdade alegremente consagram sua descompromissada devoção, sua energia e inteligência, sua solidariedade e suas vidas.

Esta ‘Declaração’ foi escrita a pedidos de um certo periódico, que subsequentemente recusou-se a publicá-lo, embora o artigo já estivesse na composição


Notas do Tradutor:
[1] Mamon: termos bíblicos são característicos da escrita de Emma, Mamon representa simbolicamente a riqueza material, cobiça (ex.: “não é possível servir simultaneamente a Deus e a Mamon”).
[2] Ismaelitas: subdivisão dos Xiitas, representa cisão, clivagem, divisão no corpo religioso do Islão.
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Emma Goldman foi uma das principais figuras do ativismo libertário nos Estados Unidos no início do século 20. Escreveu diversos livros, artigos e panfletos tendo como temas o sindicalismo, feminismo, anti-militarismo, liberdade civil e outros.

Traduzido por José Paulo M. Souza para o blog Literatura Anarquista