terça-feira, 28 de maio de 2013

Henry David Thoreau


Por Jim Powell

Se jamais houve um verdadeiro individualista, foi Henry David Thoreau. Como lembrou seu amigo, o poeta, ensaísta e filósofo Ralph Waldo Emerson, “ele não foi feito para nenhuma profissão; nunca se casou; viveu sozinho; nunca foi à igreja; nunca votou; recusava-se a pagar tributos ao Estado; não comia carne; não bebia vinho; nunca conheceu o uso do tabaco; e, embora fosse um naturalista, não usava armadilha ou arma. Ele escolheu, sabiamente para si mesmo, sem dúvida, ser bacharel do pensamento e da natureza. Ele não tinha nenhum talento para a riqueza, e sabia ser pobre sem o menor sinal de sujeira ou deselegância”. Emerson poderia ter acrescentado que Thoreau condenou a guerra e ajudou escravos fugidos. O poeta americano Walt Whitman confidenciou que “uma coisa em Thoreau o mantém muito próximo de mim: refiro-me à sua falta de leis – sua discordância – o fato de seguir absolutamente seu próprio caminho, quaisquer que sejam as consequências”.
Durante a curta vida de Thoreau, apenas dois dos seus livros foram impressos: A Week on the Concord and Merrimack Rivers [“Uma semana nos rios Concord e Merrimack”] (1849), que vendeu cerca de trezentas cópias, e Walden (1854), que vendeu pouco menos de duas mil cópias. Ainda assim, como escreveu o historiador Samuel Eliot Morison sobre uma das obras de Thoreau publicadas postumamente, “Desobediência civil (…) tornou-se a obra de literatura americana mais conhecida por pessoas lutando por liberdade na Ásia e na África, e alcançou a honra de ter sua venda proibida em países comunistas”. Seus escritos foram traduzidos para tcheco, dinamarquês, holandês, francês, alemão, hebreu, japonês, russo, sueco e ídiche, dentre outras línguas. Em The Importance of Living [“A importância de viver”], o filósofo Lin Yutang escreveu, “Thoreau é o mais chinês de todos os autores americanos em toda a sua visão da vida. (…) Eu poderia traduzir passagens de Thoreau para a minha língua e fazê-las se passar por escritos originais de um poeta chinês, sem levantar qualquer suspeita”.
Walter Harding, que foi por muito tempo o principal especialista em Thoreau, observou em 1963 que “cem anos atrás Henry David Thoreau era visto como um discípulo menor de Ralph Waldo Emerson. Cinquenta anos atrás se pensava que ele fosse um azarão que estava rápida e merecidamente em vias de ser esquecido. Hoje ele é amplamente cotado como um dos gigantes no panteão americano e sua fama é mais crescente do que decrescente. Há um consenso sobre o fato de que ele diz mais ao nosso tempo do que aos seu próprio”.
Ele expressou princípios importantes do individualismo com propriedade e paixão, e rejeitou alegações de que os indivíduos deveriam ser leais a uma autoridade coletiva. “Sou mais zeloso do que de costume no diz respeito à minha liberdade”, escreveu. “Sinto que a minha ligação e obrigação para com a sociedade são ainda muito pequenas e transitórias”. Ele acreditava haver um imperativo moral para que cada um cuidasse de sua própria vida: “Quanto a fazer o bem, esta é uma das profissões mais saturadas. Além disso, eu tentei regularmente, e, por estranho que possa parecer, estou satisfeito por isto estar em desacordo com minha constituição”. Ele não tinha nenhuma ilusão em relação ao governo. “Eu vi que o Estado era burro”, relatou, “e perdi todo o respeito que ainda tinha por ele”. Ele insistia que para alcançar a dignidade humana, as pessoas devem ser responsáveis por suas próprias vidas e manter sua independência, que é diminuída pelas esmolas governamentais. Ele demonstrou corajosa teimosia ao insistir em suas opiniões rebeldes, apesar de ser às vezes ridicularizado como se fosse excêntrico. Ele parecia falar pelos individualistas de todos os cantos quando escreveu: “se um homem não segue o passo dos seus companheiros, talvez seja porque ele ouve uma batida diferente. Deixem-no seguir os passos da música que escuta, seja seu ritmo regular ou não”.
Thoreau tinha cerca de um metro e setenta, e, disse Emerson, “bom físico, pele clara, sérios e fortes olhos azuis, e um aspecto grave”. Dentre outras coisas, Emerson admirava por Thoreau ser alguém que gostava de viver ao ar livre: “Ele usava chapéu de palha, sapatos grossos, resistentes calças cinzas, para enfrentar pequenos carvalhos e trepadeiras, e para escalar árvores em busca de ninhos de águias ou esquilos. Ele se metia dentro do lago atrás de plantas aquáticas, e suas fortes pernas formavam parte não insignificante de sua armadura”. De acordo com o biógrafo Carlos Baker, Thoreau “tinha cabelos castanhos, abundantes e de textura fina. (…) [Seus] braços eram grossamente emaranhados de pêlos, como o couro de um animal (…) [Seu nariz], curvado para baixo em formato de gancho, lembrando de certo modo o bico de uma ave de rapina. (…) [Seus olhos] com frequência luziam com uma luz cinzenta gelada”.
Ele nasceu David Henry Thoreau em 12 de julho de 1817 na casa de sua avó viúva, na Virginia Road, em Concord, Massachussets. Era filho de John Thoreau, um lojista falido que se tornou fabricante de lápis. Sua mãe, Cynthia Dunbar, era filha de um ministro Congregacionista.
Henry D. Thoreau
Apesar dos tempos difíceis, os pais de Thoreau ofereceram-lhe a oportunidade de frequentar boas escolas. Ele estudou na Concord Academy, uma escola privada considerada melhor do que as escolas públicas, e entrou para o Harvard College em 9 de agosto de 1833, quando tinha dezesseis anos.
Depois de se formar, mudou seu nome para Henry David Thoreau e assumiu um cargo de professor na Center School, uma escola de Ensino Fundamental em Concord. Aparentemente havia uma certa preocupação em relação à disciplina, e o clérigo local lhe disse que ele deveria açoitar seus estudantes. Mas Thoreau decidiu que não poderia aceitar a prática do açoitamento e decidiu sair. Ele e seu irmão John começaram uma escola em Parkman House, na Main Street, posteriormente o lar da biblioteca pública de Concord. A escola prosperou sem açoitamento.
No final de 1837, Thoreau conheceu Emerson, na época com trinta e quatro anos. O biógrafo Ralph Rusk assinalou que a “magreza de seu corpo, acentuada por seu metro e oitenta de altura, (…) os ombros estreitos e curvados, (…) sua cabeça dava a impressão de firmeza. Seu cabelo grosso e castanho, (…) suas curtas e discretas suíças emolduravam parte de uma fisionomia forte e penetrantes olhos azuis”. Nascido em Boston em 3 de maio de 1803, o ex-aluno de Harvard Emerson desenvolveu a filosofia mística do transcendentalismo, explicada em seu ensaio principal, “Nature” [“Natureza”] (1836). Seus ensaios mais duradouros foram “Self-Reliance” [“Autodependência”] e “Compensation” [“Compensação”]. Os escritos de Emerson eram abundantes em epigramas – por exemplo, “Quem deseja ser um homem, deve ser um não-conformista (…) Nada pode trazer-lhe paz senão você mesmo (…) O caráter é superior ao intelecto (…) A única maneira de ter um amigo é ser um (…) Nada de grandioso jamais foi alcançado sem entusiasmo (…) Autodependência, estatura e perfeição do homem (…) Faça-se necessário a alguém (…) A recompensa por algo bem feito é tê-lo feito (…) Nada surpreende os homens tanto quanto o bom senso e o trato franco (…) Quanto menos governo tivermos, melhor (…) Grandes homens são aqueles que enxergam que o lado espiritual é mais forte do que qualquer coisa”.
Thoreau mostrou a Emerson seu diário que um de seus professores na Harvard, William Ellery Channing, o havia incentivado a escrever. Ele havia começado a escrever em outubro de 1837, e isto se tornou uma maneira importante de desenvolver seus pontos de vista e a prática de expressá-los. Aparentemente Emerson ficou impressionado com o dom de Thoreau para a expressão e convidou-o para participar dos encontros literários conhecidos como Clube Transcendental, na casa de Emerson em Concord.
Em 1839, Henry e John Thoreau saíram por treze dias em viagem de barco pelo Rio Concord e pelo Rio Merrimack, experiência que ganhou especial significado após a morte de John por tétano em 1842. Henry resolveu escrever um livro sobre os bons tempos passados em companhia de seu irmão, mas decidiu que não poderia trabalhar em meio a tantas distrações em casa. Desta maneira, entre 4 de julho de 1845 e 6 de setembro de 1847 ele viveu na propriedade de Emerson no Lago Walden, ao sul de Concord. O Lago Walden tinha cerca de três quartos de milha de comprimento e meia milha de largura. Com um machado emprestado, Thoreau construiu uma cabana lá. Ele certamente não se isolou da civilização, como reza a lenda. Se enxergava a estrada Concord-Lincoln do seu campo, a Ferrovia Fitchburg passava pelo outro lado do Lago Walden, sua mãe e suas irmãs traziam-lhe tortas e rosquinhas, ele continuou indo jantar em casas de amigos, tinha frequentes visitantes, e em mais de uma ocasião, sua cabana serviu de estação na “Ferrovia Subterrânea”, servindo de abrigo para escravos fugidos. Thoreau ganhou dinheiro trabalhando como carpinteiro, pintor e vigilante.
Durante seu segundo ano na floresta, ele teve mais tempo para escrever. Finalizou seu primeiro livro, o tributo ao irmão, A Week on the Concord and Merrimack Rivers[“Uma semana nos rios Concord e Merrimack”], mas aparentemente não foi capaz de atrair o interesse de nenhuma editora comercial, pois conseguiu que fossem impressas somente mil cópias em 1849. Ele precisou de vários anos para quitar a dívida, e as cópias não vendidas acabaram indo parar no sótão da casa dos seus pais.
As pessoas queriam saber por que alguém formado em Harvard viveria sozinho na floresta, e em 10 de fevereiro de 1847 ele deu uma palestra, “Uma história de mim mesmo”, no Liceu Concord. A audiência adorou-o. Emerson disse a Margaret Fuller que as pessoas vieram “para ouvir os relatos da vida de diária de Henry no Lago Walden, lidos por ele como uma palestra, e ficaram fascinadas pela sua sabedoria sagaz que compreendia tudo”.
"'Desobediência Civil' tornou-se a obra de literatura americana mais conhecida por pessoas lutando por liberdade na Ásia e na África, e alcançou a honra de ter sua venda proibida em países comunistas."
Quando ele se cansou da floresta, foi viver na casa de Emerson. Lá ele escreveu uma longa carta sobre suas experiências e reflexões em Walden a Horace Greeley, editor do New York Tribune, que publicou-a na edição de 25 de maio de 1848. Após dois anos na casa de Emerson, Thoreau foi ajudar seu pai com a fábrica de lápis e viveu na casa de seus pais, que foi onde ele converteu a carta em Walden. O livro foi lançado em 1854 pela editora Ticknor & Fields.
Há muito do estilo epigramático de Emerson em Walden. O livro contém diatribes contra a competição empresarial, que havia salvo da fome multidões por todo o mundo, mas o insistente individualismo de Thoreau faz uma bela música. Dentre suas frases mais memoráveis estão: “ame sua vida”, “deixe que cada homem cuide de sua própria vida e se empenhe para alcançar o que deve”, “se alguém avança confiantemente em direção aos seus sonhos, e se esforça para viver a vida com que sonha, vai alcançar o sucesso”, “eu tinha três cadeiras em minha casa; uma para a solidão, duas para a amizade e três para a sociedade”, e “se eu soubesse que um homem estivesse vindo à minha casa com o intento consciente de me fazer o bem, eu fugiria correndo”.
Nesta época, Thoreau havia se rebelado contra os tributos. Em 1840, alguém adicionara seu nome à lista de membros da First Parish Church de Concord, e o tesoureiro da cidade exigiu que Thoreau pagasse o dízimo. Quando ele se recusou a pagar, funcionários públicos ameaçaram prendê-lo. Thoreau exigiu que seu nome fosse retirado da lista de membros da igreja. “Eu, Henry Thoreau,”, escreveu, “não desejo ser considerado membro de nenhuma sociedade à qual eu não tenha me associado”.
Em 1845 e em 1846, os Estados Unidos anexaram o Texas, e o Presidente James K. Polk provocou guerra contra o México. A guerra era especialmente popular no Sul, pois o Texas tinha terra para se plantar algodão e açúcar, o que significava mais territórios pró-escravidão.
Thoreau recusou-se a pagar a capitação, já que significava colaborar com um governo imoral, e em julho foi mandado à cadeia de Concord na Mill Dam Road. Alguém (provavelmente sua Tia Maria) pagou seus tributos e ele ficou preso somente por uma noite – ele esperava ficar mais tempo como protesto contra a guerra e a escravidão. Para explicar suas opiniões sobre os impostos, Thoreau redigiu um ensaio, o qual apresentou no Liceu Concord em 26 de janeiro de 1848. Cerca de um ano depois, Elizabeth Peabody pediu-lhe permissão para publicá-lo em um novo jornal, Aesthetic Papers, aparecendo (pela primeira e última vez) em 14 de maio de 1849. “Resistence to Civil Government” [“Resistência ao governo civil”], o artigo de Thoreau, não perdeu tempo, indo direto ao ponto logo nas primeiras linhas: “Aceito entusiasmadamente o lema ‘o melhor governo é o que governa menos’, e gostaria de vê-lo em prática rápida e sistematicamente. Levado a cabo, logo se chegaria a isto, em que eu também acredito: ‘o melhor governo é o que simplesmente não governa’; e quando os homens estiverem preparados para isto, este será o tipo de governo que eles deverão ter”. “Acho que devemos ser homens primeiro, e súditos depois”, continuou. “Não é tão desejável que se cultive um respeito pela lei, mas sim pelo que é certo. (…) Leis nunca tornaram ninguém mais justo; e, para respeitá-las até mesmo os mais bem-dispostos se tornam diariamente agentes da injustiça”. Acrescentou: “Não nasci para ser forçado. Respirarei segundo minha própria vontade. (…) Não haverá um Estado livre e esclarecido de verdade até que o Estado venha a reconhecer o indivíduo como um poder individual superior, do qual todo o seu poder e autoridade derivam, e trate-o de acordo”.
Revoltado com o auxílio do governo estadual de Massachusetts em aplicar a Lei do Escravo Fugitivo de 1850, Thoreau deu uma palestra na Convenção Anti-Escravidão em Framingham, Massachussets, em 4 de julho de 1854, publicada como “Escravidão em Massachussets” no jornal Liberator, de William Lloyd Garrison, em 21 de julho de 1854. “As leis do Estado”, afirmou, “nem sempre dizem o que é verdade; e nem sempre querem dizer o que dizem. (…) O que é necessário são homens que reconheçam uma lei superior à Constituição ou à decisão da maioria. (…) Que o Estado dissolva sua união com o dono de escravos. (…) Que cada habitante do Estado dissolva sua união com ele caso ele não cumpra com o seu dever”.
Thoreau depois defendeu o agitador abolicionista John Brown, que, convencido de que os escravos só seriam libertos por meio da rebelião armada, capturou o arsenal federal em Harper’s Ferry, Virginia, em 16 de outubro de 1859. Thoreau ficou perturbado pela violência, mas ainda mais perturbado por nenhum outro abolicionista ter defendido a intenção de Brown em libertar os escravos. Em 30 de outubro de 1859, quando Brown ainda estava na cadeia, Thoreau esteve na prefeitura de Concord, onde chamou Brown de “o homem mais bravo e humano em todo o país”.
"'Desobediência Civil' circulou entre resistentes à ocupação nazista na Europa, e se tornou panfleto de comícios."
Walter Harding relatou que “durante toda sua vida adulta, Thoreau sofreu de tuberculose intermitentemente. Em dezembro de 1860, teve bronquite, que piorou a tuberculose. Morreu perto das nove horas da noite de 6 de maio de 1862. Tinha apenas 44 anos. Sua mãe, irmã e Tia Louisa estavam com ele. O velório, três dias depois, na First Parish Church de Concord, estava lotado. A autora Louisa May Alcott assinalou que “embora ele não tenha recebido grande reconhecimento enquanto vivo, foi honrado em sua morte”. E, tratando-se de um autor sem nenhuma obra publicada, a morte de Thoreau foi amplamente noticiada. Houve notícias no Boston Daily Advertiser, no Concord Monitor, no Boston Transcript, noChristian Register, na Harvard Magazine, no Liberator , no Saturday Evening Post, no New York Tribune, no Harper’s Monthly e na Atlantic Monthly, dentre outros.
Thoreau morreu obscuro. “O mundo decidiu”, escreveu o historiador Perry Miller, “que ainda que Thoreau lhe incomodasse, ele figuraria como um naturalista menor em uma literatura onde os gigantes eram Irving, Longfellow, Lowell e Dr. Holmes. Quanto às idéias de Thoreau, este mesmo mundo presumiu que o pouco por ele demonstrado fora emprestado de Emerson e declarou que elas eram reproduzidos com uma desajeitada estranheza que, talvez momentaneamente atraente, traía sua rusticidade”.
Thoreau deixou para trás milhares de páginas e manuscritos incompletos. Sua irmã Sophia juntou-os em Excursions [“Excursões”] (1863), e trabalhou com Ellery Channing para editar The Maine Woods [“As Florestas de Maine”] (1864) e Cape Cod (1865). Emerson editou < em>Letters to Various Persons [“Cartas a várias pessoas”] (1865). Yankee in Canada, with Anti Slavery and Reform Papers [“Um ianque na Canadá; escritos abolicionistas e reformistas”] saiu em 1866. Embora estes cinco volumes estivessem incompletos e cheios de erros, eles acumularam ao menos trinta e seis revisões e ajudaram a assegurar a reputação literária de Thoreau. Havia tanta demanda por seus trabalhos que a Houghton Mifflin lançou a vigésima edição de “Walden” em 1906.
O ensaio de Thoreau “Resistência ao governo civil” é uma história em si mesmo. Em 1866, quatro anos após a sua morte, foi reintitulado “On Civil Desobedience”[“Sobre a desobediência civil”] e foi reunido em um livro junto com seu Yankee in Canada, with Anti Slavery and Reform Papers. Poucas pessoas fora dos Estados Unidos pareciam apreciar os escritos naturalistas de Thoreau, mas Desobediência Civil tornou-se um grito de guerra. O romancista e filósofo russo Leon Tolstoy ficou impressionado e citou Thoreau dentre os autores que “me influenciaram especialmente”. Tolstoy incluiu muitas seleções de Thoreau em sua antologia Um círculo de leitura.
Walter Harding, biógrafo de Thoreau, descobriu que “tem havido um interesse de longa data em Thoreau por parte dos judeus. Desobediência civil foi traduzido para ídiche em Nova York em 1907 e posteriormente em Los Angeles em 1950. Tem havido artigos frequentes sobre Thoreau em ídiche em jornais de todo o mundo”.
Quando Mohandas Gandhi estava estudando Direito na Inglaterra, conheceu Henry Salt, biógrafo de Thoreau. Por volta de 1907, Gandhi se opunha a leis na África do Sul que impediam que indianos viajassem, comerciassem e vivessem livremente, e um amigo lhe deu uma cópia de Desobediência civil, que ele leu enquanto esteve preso por três meses em Pretoria. Ele reconheceu que “as idéias de Thoreau me influenciaram grandemente. Adotei algumas delas e recomendei o estudo de Thoreau a todos os amigos que me ajudavam na causa da independência da Índia. O nome do meu movimento foi retirado do ensaio de Thoreau Sobre o dever da desobediência civil. (…) Até ler aquele ensaio, nunca havia encontrado uma tradução em apropriada em inglês para a palavra indiana Satyagraha. (…) Não há dúvidas de que as idéias de Thoreau influenciaram enormemente meu movimento na Índia”. Harding relatou que Gandhi “sempre carregou uma cópia [de Desobediência civil] consigo nas várias vezes em que foi preso”. Havia um panfleto em Nova Délhi, Henry David Thoreau: The Man Who Moulded the Mahatma’s Mind [“Henry David Thoreau: o homem que moldou as idéias do Mahatma”].
"Thoreau recusou-se a pagar a capitação, já que significava colaborar com um governo imoral, e em julho foi mandado à cadeia de Concord na Mill Dam Road. Alguém pagou seus tributos e ele ficou preso somente por uma noite – ele esperava ficar mais tempo como protesto contra a guerra e a escravidão."
O historiador Peter Miller observou que Desobediência civil circulou “entre resistentes à ocupação nazista na Europa, e se tornou panfleto de comícios”. De acordo com Harding, “líderes do movimento de resistência dinamarquês viram Desobediência civil como um manual de guerra”.
Quando Martin Luther King Jr. estava prestes a lançar o movimento pelos direitos civis com protestos não-violentos contra a segregação racial apoiada pelo governo em Montgomery, Alabama, ele começou “a pensar a respeito do Ensaio sobre a desobediência civil, de Thoreau. Lembro de como a leitura deste artigo mexeu comigo quando eu estava na faculdade. Convenci-me de que aquilo que nós estávamos preparando para fazer em Montgomery tinha relação com o que Thoreau havia expressado. Nós estávamos apenas dizendo à comunidade branca, ‘Nós não podemos mais cooperar com um mau sistema’”.
Em 1965, um grupo de acadêmicos liderados por Walter Harding começou a trabalhar em The Writings of Henry D. Thoreau [“Os escritos de Henry D. Thoreau”], a coleção definitiva de seus trabalhos, e buscaram manuscritos em mais de 40 bibliotecas; os maiores acervos se encontram na Houghton Library (Universidade de Harvard), na Huntington Library (San Marino, California), na J. Pierpont Morgan Library (Nova York) e na New York Public Library. Estes manuscritos foram laboriosamente transcritos. Um editor notou que “Thoreau escrevia com uma forte inclinação para direita. (…) Algumas de suas letras se parecem muito, especialmente o ‘r’, o ‘s’ e o ‘z’. Para piorar ainda mais, Thoreau cometia erros ortográficos e gramaticais com frequencia. (…) Ele também escrevia palavras juntas, o que torna às vezes difícil definir quando uma palavra termina e outra começa”. A Princeton University Press lançou a primeira edição (Walden) em 1971; catorze edições se seguiram desde então, e o projeto continua.
O historiador Miller observou que Thoreau, “se tornou um deus da literatura moderna. Onde quer que se leia em inglês, ou ele possa ser traduzido, Thoreau é uma das principais vozes do século XIX, que fala para o século XX na Índia, no Japão e na África Ocidental tanto quanto nos Estados Unidos, com mais e mais ressonância. (…) O discípulo agora brilha mais forte que o mestre: Thoreau esta mais vivo na estima popular que Emerson, e Longfellow, Lowell e Holmes se tornaram passatempos de antiquários”.
A tendência recente tem sido enfatizar os escritos naturalistas de Thoreau acima de tudo, sem dúvidas por consequência do movimento ambientalista. A aclamada série Library of America, por exemplo, lançou uma edição de 1.114 páginas de Thoreau que não incluiu uma única página sobre seus escritos políticos. Ainda assim, para as pessoas que valorizam a liberdade, estes escritos colocam Thoreau dentre os imortais. Ele afirmou o imperativo de julgar as leis de acordo com princípios morais e, quando necessário, permanecer sozinho contra o Estado.
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Jim Powell, senior fellow do Cato Institute, é especialista na história da liberdade. Seu livro mais recente é Greatest Emancipations: How the West Abolished Slavery.


Publicado no site Ordem Livre

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