terça-feira, 11 de junho de 2013

Contra o Fascismo


Texto retirado do livro “Serviço obrigatório para a mulher? Recuso-me. Denuncio!”. Fevereiro de 1933.

Por Maria Lacerda de Moura

Sem Pátria, sem Fronteiras, sem Família e sem Religião... “Afirmando” a Humanidade, tenho que “negar a Cidade”... Fora da Lei: recuso os direitos de Cidadania. O Estado, como a Igreja, são de origem divina... Patriotismo, nacionalismo, fronteira, pavilhão nacional são corolários. Ídolos vorazes, os Deuses dos exércitos e dos autos de fé exigem vítimas de massa.

A minha família sou eu quem a escolhe.
A Lei impede o direito da escolha e os costumes solidificam as leis.
A Lei nada tem que ver com as minhas predileções afetivas.

Aliás, podemos definir a Lei como as palavras de Rafael Barret: “A Lei se estabelece para conservar e robustecer as posições da maioria dominante; assim, nos tempos presentes, em que a arma das maiorias é dinheiro, o objeto principal das leis consiste em manter inalterável a riqueza do rico e a pobreza do pobre”. A prova cabal está na queima do trigo, do café, da superprodução – quando há no mundo 75.000.000 de famintos sem trabalho: para manter o preço alto das mercadorias; em benefício, não do produtor; mas; do capitalista, que se apoderou do produto – inutiliza-se o trabalho do produtor e deixamo-lo a braços com a miséria e a falta de ocupação.

Uma sociedade capaz de organizar perversamente, legalmente, de tal modo, os costumes bárbaros de acumular riquezas á custa da fome, é de tal requinte de crueldade que não merece absolutamente nenhuma concessão.
Sejamos objetores de consciência agora que, no Brasil, discutem-se os, projetos de uma Constituição moderníssima, tocando as raias do fascismo...

Porque, se para as trincheiras, é feita a seleção (as avessas!) e são escolhidos os fortes e jovens – para os serviços militares da retaguarda, nas próximas guerras de extermínio, serão todos aproveitados – homens, mulheres, velhos, enfermos e crianças.

E não façamos como os padres e religiosos congregados que organizam batalhões e os mandam para as, trincheiras, conservando-se, aliás, prudentemente, a distância e, depois, recusam-se ao serviço militar obrigatório, sob a alegação de motivo de crença religiosa...
Não nos apoiemos em nenhuma espécie de muletas e muito menos na muleta de qualquer religião – revelada ou positiva.

Sejamos objetores de consciência – pôr humanidade. Contra a tirania. Contra a crueldade. Contra a violência. Contra a Autoridade. Contra todo e qualquer despotismo. Contra a tirania da força armada para a defesa do Estado – que é o partido dos que estão de cima.

"A concepção fascista do Estado é de um ser com direito a tudo, de origem divina.O indivíduo é absorvido pelo estado: é apenas número, elemento, material humano. É a nova concepção do Estado não só fascista como bolchevique."

Caminhamos, também nós, no Brasil, para o Fascismo cruel e teatral. Ainda há pouco (12 de Dezembro de 1932), no banquete oferecido ao General Góes Monteiro, o herói do dia se refere a “famosa” entrevista de Mussolini a Ludvig: “A organização militar é uma síntese da organização nacional. Sem nação organizada e disciplinada não pode haver Exército. Sem Exército não pode haver soberania. Sem soberania, não há Estado”.
E o General Góes Monteiro acrescenta que a tendência da Constituição política brasileira deve orientar-se incessantemente para a unidade total, política social, moral, jurídica, econômica e espiritual”.

É a disciplina a que se refere Mussolini . : A “ação integralista”. . E mais, diz o General Goés Monteiro: “Toda liberdade concedida contra os interesses do Estado será um foco de onde podem brotar germes perigosos. Toda liberdade para fortalecer a segurança do Estado é um bem para a coletividade que deve viver sob permanente equilíbrio social – o que só a justiça incorruptível alcançará, guiada pelo senso das nossas realidades e necessidades” (O Estado de São Paulo – 13/12/1932).

A concepção fascista do Estado é de um ser com direito a tudo, de origem divina.
O indivíduo é absorvido pelo estado: é apenas número, elemento, material humano. É a nova concepção do Estado não só fascista como bolchevique.

Diz um artigo de Roger Crosti em “L’Europe Nouvalle” sobre a concepção fascista de Estado: “Para os teóricos do Fascismo, como o Sr. Giovanni Gentile ou o próprio chefe de governo, o Estado é uma atividade moral, uma realidade ética, programa, missão, espírito”.

......................

Também nós, desgraçadamente, caminhamos para o Fascismo tragicômico.
Já temos uma polícia especializada. Já temos a “Carta del Lavoro” e o Ministério... policial do Trabalho. Vamos ter voto obrigatório para homens e mulheres. Teremos o “serviço militar obrigatório total”, isto é – para ambos os sexos!

Recuso-me.

Denuncio.

______________________________________________________________________________________________
Maria Lacerda Moura foi professora e ativista libertária. Defensora do anarquismo individualista, seus trabalhos eram centrados em temas como o feminismo, a educação e o anarquismo.

Veja também: