Por Roderick Long
Na
semana passada, Michael Lind fez uma pergunta tola (“A
questão que os libertários simplesmente não podem responder”):
Se o libertarianismo é tão bom, por que nenhum país tentou
adotá-lo?
A
pergunta é tola porque a resposta libertária é óbvia: o
libertarianismo é bom para os cidadãos comuns, mas não para as
elites do poder que controlam os países, determinando quais
políticas implementam, e, portanto, não recebendo cordialmente
medidas que exponham seu status privilegiado à concorrência de
livre mercado. E os cidadãos comuns não apoiam as políticas
libertárias, visto que: i) a maioria deles não está familiarizada
com todos os benefícios do libertarianismo, e também ii) porque o
sistema educacional é controlado por aquelas elites mencionadas
acima.
A
pergunta de Lind é análoga àquelas que poderiam ser feitas alguns
séculos atrás: se a tolerância religiosa, ou igualdade entre
sexos, ou a abolição da escravatura eram tão boas, por que nenhum
país adotou-as? Todas essas perguntas equivalem a questionar: se a
liberação da opressão é tão grande para os oprimidos, por que os
opressores não as adotaram?
E.
J. Dionne propõe uma resposta distinta (“O
calcanhar-de-aquiles do Libertarianismo”)
à pergunta de Lind: “Nós tivemos algo próximo à utopia
libertária de governo mínimo no final do século XIX e decidimos
que não funcionava”.
Deixando
de lado o uso orwelliano de “nós” – como uma afirmação séria
sobre a história, isso é um absurdo. Mesmo se ignorássemos, como
não deveríamos, as inabilidades jurídicas anti-libertárias
impostas às mulheres, não brancos, e homossexuais (isto é, a
maioria da população), permanece verdade que os Estados Unidos do
final do século XIX foi caracterizado por uma intervenção vigorosa
e sistemática do governo em nome das grandes negócios (às vezes
envolto em uma retórica de laissez-faire, outras na retórica
progressista). Um governo que habitualmente leva a polícia ou o
exército às ruas para terminar com greves é dificilmente um regime
laissez faire.
Na
década de 1880, o anarquista de livre mercado Benjamin Tucker identificou a dominação dos interesses empresariais na
Idade de Ouro baseado em uma variedade de monopólios impostos pelo
Estado, destacando quatro em particular: tarifas
protecionistas;
a monopolização do crédito por meio do controle governamental da
oferta de moeda; a supressão da competição via monopólios
informais (patentes e
direitos de propriedade intelectual); e a transmissão legal de
títulos de propriedade de terras e recursos naturais com base na
expropriação e influência política ao invés de propriedade e
comércio. Junto a esses, Tucker listou a monopolização de serviços
de segurança representados pela instituição do próprio estado.
A
manipulação do mercado em favor dos grandes negócios não terminou
na Era do Ouro. A alegação de Dione de que naquela era “monopólios
se formavam facilmente” ignora a pesquisa histórica de James
Weinstein e Gabriel
Kolko
mostrando que as supostas regulações anti-trust da era progressista
(e, da mesma forma, Butler Shaffer, mostrou, aquelas do New Deal)
foram atualmente propostas pela elite corporativista, de maneira a
gerar monopólios que não poderiam sobreviver no livre mercado. A
visão de Dionne sobre o New Deal como salvador de um governo que
estava anteriormente “sem ajuda” e “algemado” por uma
“ideologia anti-governo” é ridícula. O grande governo de
Roosevelt, criador de políticas cartelizantes foi largamente
uma continuação do governo de Hoover.
E dada a destruição do sistema de saúde disponível no início do
século XX pelo poder político da classe medica, como documentado
pelo historiador David Beito. A alegação de Dionne que o laissez
faire deixou os pobres “incapazes de pagar planos de saúde” é
literalmente adicionar insulto à injúria.
O
mito do laissez-faire do século XIX é
útil para os estatistas tanto da esquerda quanto da direita. Como o
anarquista de mercado Kevin Carson observa,
“os defensores do estado de bem estar regulatório devem fingir que
as injustiças da economia capitalista resultam do mercado
desenfreado, ao invés da intervenção estatal no mercado”, posto
que, de outra forma, “eles não poderiam justificar seu próprio
poder como solução”. Justamente por isso, “apologistas das grandes empresas” necessitam “fingir que um estado de bem estar
regulatório era algo imposto sobre eles por ideólogos
anti-negócios, em vez de algo que eles mesmos trabalharam arduamente
para criar”.
A
identificação de Dionne com a Tea Party (ala mais conservadora do
Partido Republicano) mostra que ele mesmo foi enganado pela retórica
anti-governo do que é principalmente (com algumas poucas exceções)
um campanha governamental pro-corporativismo (capitalismo de
compadres), legislação moral intrusiva, assédio a imigrantes
pacíficos, e uma politica
externa sanguinária.
As regulações contra as quais os participantes da Tea Party
reclamam são principalmente regulações secundárias, desenvolvidas meramente para dirimir os efeitos daquelas regulações primárias
que mantem as estruturas de poder essenciais em voga.
Uma
pergunta melhor poderia ser feita a Lind e Dionne: se o estado
intrusivo é tão bom, por que ele necessita reter seus clientes pela
força, em vez de permitir que eles pacificamente optem ou não por
ele?
Tradução
de Matheus Pacini. Revisão de Ivanildo Terceiro.
Roderick T. Long é um anarquista de mercado de esquerda e leciona filosofia no Auburn University. É presidente do Molinari Institute e do Molinari Society.
Veja também:
- Socialismo de estado e anarquismo
- O subsídio da história
- Mercados libertos do capitalismo
- Ponto para a esquerda pró-livre mercado