Por
Emma Goldman
Publicado
originalmente em Mother Earth, Vol. IV, No. 5, Julho de 1909.
Quando,
no curso do desenvolvimento humano, as instituições existentes
provam-se inadequadas às necessidades do homem. Quando elas servem
meramente para escravizar, roubar, e oprimir a humanidade, o povo
possui o direto eterno de se rebelar, e derrubar, estas instituições.
O
mero fato destas forças – antagônicas a vida, a liberdade, e a
busca de felicidade – estarem legalizadas pela constituição,
santificadas por direitos divinos, e reforçadas pelo poder político,
de nenhum modo justificam o prolongamento de sua existência.
Sustentamos
que estas verdades sejam auto-evidentes: que todos os seres humanos,
independentemente de raça, cor, ou sexo, nascem com o direito igual
de compartilhar à mesa da vida; e que para que este direito seja
assegurado, deve se estabelecer entre os homens a liberdade
econômica, social e política; sustentamos além, que o governo
existe apenas para manter privilégios especiais e o direito a
propriedade; que coage o homem à submissão e, portanto, rouba sua
dignidade, seu auto-respeito, e sua vida.
A
história dos reis americanos do capital e da autoridade é a
história de repetidos crimes, injustiças, opressões, ultrajes, e
abusos, todos almejando a supressão das liberdades individuais e a
exploração do povo. Um país vasto, rico o bastante para suprir
todos seus filhos com todos os confortos possíveis, e assegurar o
bem-estar a todos, está nas mãos de uma minoria, enquanto que os
milhões de anônimos ficam à mercê de implacáveis caçadores de
fortunas, legisladores inescrupulosos e políticos corruptos.
Robustos filhos da América estão sendo forçados a mendigar pelo
país numa busca infrutífera por pão, e muitas de suas filhas estão
sendo despejadas nas ruas, enquanto centenas de crianças em tenra
idade são sacrificadas diariamente ao altar de Mamon[1]. O reinado
destes reis está mantendo a humanidade em escravidão, perpetuando a
pobreza e a doença, sustentando o crime e a corrupção; está pondo
a ferros o espírito da liberdade, estrangulando a voz da justiça, e
degradando e oprimindo a humanidade. Está engajado numa contínua
guerra e matança, devastando o país e destruindo as melhores e mais
nobres qualidades do homem; nutrindo superstições e ignorância,
semeando o preconceito e a discórdia e convertendo a família humana
em um campo de Ismaelitas[2].
"Todos os seres humanos, independentemente de raça, cor, ou sexo, nascem com o direito igual de compartilhar à mesa da vida; e que para que este direito seja assegurado, deve se estabelecer entre os homens a liberdade econômica, social e política."
Nós,
portanto, os homens e mulheres amantes da liberdade, compreendendo a
grande injustiça e brutalidade deste estado de coisas, com ousadia e
seriedade declaramos por meio desta que cada individuo é e deve ser
livre para possuir a si próprio e para gozar plenamente dos frutos
de seu trabalho; que o homem está absolvido de quaisquer obrigações
para com os reis da autoridade e do capital; que ele possui, pelo
próprio fato de existir, livre acesso a terra e a todos os meios de
produção, e a completa liberdade de dispor dos frutos de seus
esforços; que cada individuo tem o inquestionável e inalienável
direito de associação livre e voluntária com outros indivíduos
igualmente soberanos para propósitos econômicos, políticos,
sociais e quaisquer outros, e que para alcançar este fim o homem
deve emancipar a si próprio da sacralidade da propriedade, do
respeito às leis dos homens, do temor à Igreja, da covardia da
opinião pública, da estúpida arrogância de superioridade
nacional, racial, religiosa e sexual, e da estreita concepção
puritana de vida humana. E em prol desta Declaração, e com uma reta
confiança na harmoniosa combinação de tendências sociais e
individuais do homem, os amantes da liberdade alegremente consagram
sua descompromissada devoção, sua energia e inteligência, sua
solidariedade e suas vidas.
Esta
‘Declaração’ foi escrita a pedidos de um certo periódico, que
subsequentemente recusou-se a publicá-lo, embora o artigo já
estivesse na composição
Notas
do Tradutor:
[1]
Mamon: termos bíblicos são característicos da escrita de Emma,
Mamon representa simbolicamente a riqueza material, cobiça (ex.:
“não
é possível servir simultaneamente a Deus e a Mamon”).
[2]
Ismaelitas: subdivisão dos Xiitas, representa cisão, clivagem,
divisão no corpo religioso do Islão.
________________________________________________________________________________________
Emma
Goldman foi uma das principais figuras do ativismo libertário nos
Estados Unidos no início do século 20. Escreveu diversos livros,
artigos e panfletos tendo como temas o sindicalismo, feminismo,
anti-militarismo, liberdade civil e outros.
Traduzido
por José Paulo M. Souza para o blog Literatura Anarquista