Por
David Bollier
A
agenda de austeridade costuma ser apresentada como inevitável, mas
na verdade isso é só uma desculpa que corporativistas e
conservadores usam para evitar qualquer discussão e debate. “Não
existem alternativas!” eles trovejam. Mas como o site Co-operatives UK demonstra
em um novo e brilhante relatório,
existe uma diversidade crescente de alternativas práticas que são
tanto viáveis financeiramente quanto efetivas socialmente. Elas são
conhecidas como cooperativas multi-stakeholder (N.T.:
de múltiplas partes), ou simplesmente como “cooperativas sociais”.
A
maioria de nós está familiarizada com cooperativas de consumidores
ou de trabalhadores, mas a cooperativa social é um pouco diferente.
Em primeiro lugar, elas recebem de braços abertos vários tipos de
membros – de funcionários pagos e voluntários a usuários de
serviços e membros familiares e até investidores em economia
social. Se, por um lado, muitas cooperativas se parecem e operam como
suas primas no mercado tradicional, com um foco intenso em lucro e
prejuízo, cooperativas sociais estão comprometidas com objetivos
sociais como saúde, assistência a idosos, serviços sociais, e
integração de ex-prisioneiros à força de trabalho. Elas conseguem
misturar a atividade de mercado com o fornecimento de serviços
sociais e com a participação democrática, tudo de uma vez.
Pat
Conaty é o autor do relatório “Cooperativas Sociais: Uma Agenda de Coprodução Democrática para Serviços de Bem-Estar no Reino Unido” .
Ele explica como as estruturas legais e organizacionais de
cooperativas sociais — assim como seu ethos cultural — geram todo
tipo de vantagem. Elas conseguem fornecer serviços de maneira mais
eficiente que muitos negócios convencionais. Elas são mais
adaptáveis e responsáveis que muitos programas do governo. E elas
convidam a participação ativa e inclusiva de membros para decidir
como lidar com suas necessidades — e para contribuir com seu
próprio conhecimento e energias.
O
relatório examina as melhores práticas de serviços cooperativos em
saúde e bem-estar social, e traça um perfil do sucesso de
cooperativas sociais na Itália, Japão, França, e Espanha, entre
outros países, bem como em Quebec, Canadá.
A
experiência italiana com cooperativas sociais é especialmente
impressionante. Desde a aprovação de uma lei de 1991 que autoriza
cooperativas sociais e oferece políticas públicas em apoio a elas,
os italianos fundaram 14.500 cooperativas sociais que empregam
360.000 trabalhadores pagos e dependem de mais 34.000 membros
voluntários. A cooperativa típica tem menos que 30
membros-trabalhadores, e fornece serviços para idosos, deficientes,
e pessoas com doenças mentais. Algumas fornecem “empregos
protegidos” para pessoas com deficiências e outros grupos
vulneráveis.
Atualmente,
cooperativas sociais estão fornecendo serviços para quase cinco
milhões de pessoas na Itália. Elas trazem e gastam nove bilhões de
euros anualmente. A sua taxa de sobrevivência após cinco anos é de
89 por cento.
Em
Quebec, “cooperativas solidárias” tem construído uma economia
alternativa de “solidariedade social” desde 1995. Essas
cooperativas estão criando elos entre o movimento de cooperativas,
sindicatos trabalhistas e o setor público enquanto atendem às
necessidades das pessoas com eficiência e compaixão. O foco central
do movimento de Quebec, Conaty escreve, é a criação de empregos e
assistência domiciliar, mas elas também são usadas para
“regeneração rural” ao ajudar a salvar lojas, correios e
serviços sociais em áreas rurais.
O
que é empolgante sobre as cooperativas sociais é sua habilidade de
misturar de maneira criativa práticas públicas com a atividade de
mercado – sem deixar que as forças de mercado dominem a agenda.
Além disso, elas não simplesmente “administram serviços” no
estilo de uma organização sem fins lucrativos tradicional;
cooperativas são dirigidas por seus membros e respondem a eles.
“O
modelo da cooperativa social transforma usuários de cuidados sociais
em parceiros, juntos com a força de trabalho, com ambos tendo uma
participação no capital da empresa e acesso aos frutos do sucesso”,
diz Ed Mayo, Secretário Geral da Cooperatives UK, um grupo britânico
que promove a economia cooperativa.
Por
que cooperativas sociais funcionam? Claramente, existem vários
fatores indo de políticas públicas esclarecidas a culturas
nacionais e compromissos éticos. Mas a ideia de coprodução é um
motor poderoso que sustenta essa instituição social. Como descrito
por duas acadêmicas britânicas, Sarah Carr e Catherine Needham:
“O termo coprodução é usado cada vez mais para se referir a novos tipos de serviços públicos no Reino Unido, incluindo novas abordagens a cuidados sociais para adultos. Ele se refere à participação ativa de pessoas que usam serviços, bem como — ou em vez de — aquelas que tradicionalmente os tem fornecido. Ele dá ênfase ao fato de que as pessoas que usam serviços têm recursos, que podem ser utilizados para melhorar esses serviços, e não só necessidades a serem satisfeitas. Esses recursos geralmente não são financeiros, mas sim habilidades, experiência, e apoio mútuo que usuários de serviços podem contribuir para serviços públicos.”Não é preciso dizer que a maior parte dos mercados e burocracias estatais não conseguem compreender a ideia de uma “democracia associativa” participativa e a construção de instituições alternativas que incentivem a participação. Mas, como explica Henry Tam da Universidade de Cambridge:
“Comunidades inclusivas são formas mais eficazes de associação humana porque reconhecem o valor intrínseco de permitir que todos os seus cidadãos/membros/interessados interajam uns com os outros como iguais na hora de decidir como o poder vai ser utilizado por eles, pelo bem do todo e de cada um. Esse modelo comunitário é baseado na criação do pensamento cooperativos pelos socialistas utópicos de Owen e democratas cooperativos do final do século XIX/começo do século XX.”O relatório de Conaty se aprofunda nos desafios organizacionais, legais e financeiros para o estabelecimento de cooperativas sociais de sucesso — e indica soluções disponíveis. Por exemplo, cooperativas sociais precisam de novos tipos de políticas públicas e de novos tipos de financiamento, tais como financiamento de risco e financiamento social.
Considerando
o papel que cooperativas sociais podem desempenhar na reconstrução
da cultura democrática, ao mesmo tempo em que satisfazem
necessidades sociais urgentes e insatisfeitas, todos deveriam estar
prestando mais atenção à grande promessa das cooperativas sociais.
Esse relatório oferece uma análise factual importante para
inaugurar uma nova conversa sobre uma alternativa atraente e de
eficácia comprovada.
Traduzido por Pedro Galvão de França Pupo para o site Mercado Popular. Para ler o texto original clique aqui.
David Bollier é um ativista, estrategista político e escritor americano, tendo diversos livros publicados. É co-fundador do "Commons Strategies Group" e " Public Knowledge" e "Senior Fellow" do "Norman Lear Center". Para acessar seu blog pessoal clique aqui.
Veja também:
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- Você não consegue Competir com a Cooperação – A artificial corrida de ratos do capitalismo
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